quarta-feira, 30 de junho de 2010

Proclamação da República

Ano: 1914
Valor Facial: 1 escudo
Metal: prata 835 º/oo
Acabamento: normal
Diâmetro: 37 mm
Peso: 25 g
Bordo: serrilhado
Eixo: vertical
Tiragem: 1.000.000
Escultor: A/ Francisco dos Santos - R/ José Simões de Almeida (Sobrinho)
Gravador: Alves do Rego
Legislação: Decreto-Lei nº 927 de 3 de Outubro de 1914

A/: à direita do campo, tendo em fundo o Sol nascente sobre a Terra, a figura simbólica da República, de meio corpo à esquerda, envolvida na bandeira nacional e empunhando um facho aceso na mão direita, tendo por baixo a inscrição "5 de Outubro de 1910", em três linhas e, na orla superior, a legenda "República Portuguesa", entre pares de estrelas

R/: ao centro do campo, o escudo das Armas Nacionaais assente num "fascio" romano de varas e machado, circundado por vergônteas de louro e de carvalho entrelaçadas em baixo por um laço e, na orla inferior, o valor "1 Escudo".

Poucos meses passados sobre a Revolução de 5 de Outubro de 1910 o governo provisório da República decretou a mudança da unidade monetária, que de real passou, em 5 de Maio de 1911, a designar-se por escudo (de ouro), equivalente a mil reais dos anteriores e com um peso legal de 1,8065 gramas (de toque 900 milésimos).

Acrescentaremos, apenas como simples curiosidade, que a paridade então estabelecida em relação à libra esterlina foi de uma libra de ouro igual a 4,5 escudos de ouro.

Foram também criadas por essa lei de Maio de 1911, as novas moedas da República, de ouro (que nunca chegaram a cunhar-se), de prata e de bronze níquel, que entrariam em circulação desde meados de 1912.

Apesar de desde 1911 se ter pensado criar e emitir moedas comemorativas da proclamação da República, seria só em 1914 que viria a concretizar-se essa oportunidade, tendo então o Congresso da República autorizado o governo a cunhar moedas de prata de um escudo, cujo lançamento em circulação se pretendia coincidisse com o dia 5 de Outubro de 1914.

Esta primeira moeda comemorativa da República merece uma especial menção sob o ponto de vista artístico, pois que representa um interessante exemplo de “Arte Nova” na escultura numismática nacional, sem dúvida influenciada pela correspondente arte medalhística, que de França entrou em Portugal pela mão de dois dos nossos mais notáveis escultores, João da Silva e José Simões de Almeida (sobrinho).

Há uma outra história ainda por contar sobre as gravuras numismáticas que ornamentam essa primeira moeda representativa do escudo republicano, cunhada em substituição das anteriores espécies comemorativas de bronze-níquel previstas no decreto de 1911 e cuja amoedação não proporcionava grande lucro.

Em Junho de 1914, nas vésperas da deflagração da Primeira Guerra Mundial e quando as questões da defesa nacional tinham já adquirido significativa importância nas preocupações do Governo e do Parlamento, a proposta de lei orçamental do Ministério das Finanças para o ano económico de 1914/1915 passou a incluir, sob proposta de Afonso Costa, a emissão de uma nova moeda de prata de 1 escudo comemorativa da proclamação da República, cujos lucros de amoedação, calculados em 613.616$00, ficariam reservados para as despesas da defesa nacional. Em simultâneo, e tendo em vista aumentar os lucros da amoedação de prata, o toque das moedas de 1 escudo foi reduzido para 835 º/oo, o que proporcionaria uma economia suplementar de 143.812$ (Lei n.º 220, de 30 de Junho de 1914).

Conhecendo-se o tempo necessário para o aprontamento dos cunhos para uma nova moeda, verifica-se que essa cunhagem já vinha sendo preparada com antecedência, pelo menos desde início de 1914, quando Afonso Costa ainda era o titular da pasta das Finanças. A urgência pretendida pelo Governo e a data prevista para o lançamento público, 5 de Outubro, influíram decisivamente na escolha dos modelos para as suas gravuras numismáticas, que tinham de ser diferentes das das moedas de prata da emissão normal.

Nessa altura já estavam em poder da Casa da Moeda as fundições em bronze dos modelos aprovados para as moedas de bronze-níquel, peças indispensáveis para a gravação mecânica das matrizes em aço.

Por razões que ainda hoje não são conhecidas, a Casa da Moeda abandonou o modelo Pátria do anverso premiado para as moedas comemorativas desse metal, da autoria de Simões de Almeida (Sobrinho), e seleccionou o anverso do modelo alvorada classificado em seundo lugar, da autoria de Francisco dos Santos.

Quanto ao reverso, foi seleccionado um outro modelo, também classificado em segundo lugar, mas no concurso para as moedas de ouro, cujo processo de selecção terminara a 5 de Dezembro de 1913. E será precisamente este modelo de reverso não aprovado em 1913 para a moeda de ouro, onde o escudo nacional aparece assente num "fascio" romano e circundado por vergônteas de louro e de carvalho, que será utilizado para compor essa face da nova moeda comemorativa, a primeira a ter uma dupla autoria.

As duas primeiras moedas cunhadas a 28 de Agosto de 1914 foam entregues pelo ministro das Finanças ao tesoureiro da Casa da Moeda, para o seu museu numismático, onde ainda hoje se encontram.

A Revolução de 5 de Outubro de 1910

O 5 de Outubro de 1910 foi uma data histórica para Portugal. Neste dia terminou um regime político, que durante centenas de anos governou o nosso país. Contudo, a mudança da Monarquia para a República implicaria todo um conjunto de preparativos, com avanços e recuos, que nos conduziriam a esse dia de grandes sacrifícios e muitas alegrias, que foi o 5 de Outubro de 1910.

ANTECEDENTES
O 31 de Janeiro de 1891

Na Conferência de Berlim de 1884-1885 reuniram-se as potências coloniais africanas da época, sendo estas a França, a Alemanha, a Grã-Bretanha e Portugal. Esta conferência tinha como finalidade a distribuição dos territórios africanos pelas quatro potências. Portugal há muito que pretendia unir a costa angolana à moçambicana, ocupando todo o território de África que ficava entre as suas duas colónias.

Para o efeito Portugal tinha organizado um conjunto de expedições a esses territórios centrais, como as de Hermenegildo Capelo e Serpa Pinto. Igualmente Portugal seguiu uma política de colonização dos seus espaços africanos. Desta política nasceu o célebre Mapa-Cor-de-Rosa, idealizado pelas autoridades portuguesas e onde claramente estavam manifestadas as intenções de Portugal.

A Inglaterra opunha-se terminantemente a tal ocupação, já que tinha como objectivo a ocupação de um vasto território que ligaria o Sudão ao Cabo. Depois desta Conferência, Portugal inicia a ocupação militar desta zona central de África, entre Angola e Moçambique. A Inglaterra vendo que Portugal não desistia das suas pretensões faz, em 11 de Janeiro de 1890, um ultimato ao nosso país, ameaçando que cortaria de imediato relações diplomáticas caso Portugal persistisse na ocupação destes territórios, podendo mesmo entrar em conflito militar.

O rei e as restantes autoridades portuguesas decidem recuar perante o ultimato inglês, o que viria a causar um tremendo mau estar não só nos monárquicos, mas especialmente nos republicanos. Alguns republicanos radicais aproveitando este descontentamento promovem uma revolta no Porto, com o fim de implantar a República em Portugal.

Esta revolta iniciou-se no dia 31 de Janeiro de 1891 e foi sem qualquer dúvida, a primeira grande tentativa de implantação do regime republicano em Portugal. Na madrugada do dia 31 de Janeiro de 1891 vários regimentos militares da cidade do Porto sublevaram-se e vieram para a rua dando vivas à República. Caçadores 9, Infantaria 10, Infantaria 18, Cavalaria 6, a Guarda Fiscal, foram os principais
regimentos que se sublevaram. Contudo a Guarda Municipal não aderiu ao golpe.

As forças republicanas deslocaram-se então para a Praça D. Pedro, junto aos Paços do Concelho. Santos Cardoso, que era um dos chefes dos revoltosos, içou nos Paços do Concelho a bandeira vermelha do Centro Democrático Federal de 15 de Novembro, já que nesta altura ainda não existiam bandeiras republicanas.

Nessa mesma manhã, pelas 7 horas, o Dr. Alves da Veiga, ilustre advogado do Porto e grande republicano, pronunciou um eloquente discurso e o actor Miguel Verdial leu os nomes do Governo Provisório da República. Estava implantada a República, mas não estava derrubada a monarquia.

As forças republicanas seguiram então pela rua de Santo António em direcção à Vila de Banhos, onde são alvejadas pela Guarda Municipal, fiel à Monarquia, sendo derrotadas depois de um intenso tiroteio de mais de duas horas. Entretanto, os restantes republicanos entrincheirados nos Paços do Concelho são atacados pela Guarda Municipal, sendo obrigados a render-se. A República teria que esperar mais uns bons anos.

A cidade do Porto era essencialmente monárquica e, ao contrário de Lisboa, aquando do ultimato inglês, não se deram nesta cidade quaisquer tipos de manifestações hostis à monarquia. Então porque se deu aqui o golpe republicano do 31 de Janeiro de 1891? Porque residiam no Porto um conjunto de republicanos radicais, que há muito se vinham manifestando pela necessidade de implantar a República pela força, ao contrário dos republicanos de Lisboa, moderados, que entendiam que a República deveria ser instituída de forma evolutiva.

Os republicanos de Lisboa chegavam mesmo a criticar os republicanos radicais portuenses, não só pelas suas ideias como também pelas acções que protagonizavam, pelo que não foi estranho que quando se dá o 31 de Janeiro de 1891, este não tenha recebido um único apoio de Lisboa, estando assim condenado ao fracasso.

A Morte do Rei D. Carlos e as suas consequências
No dia 1 de Fevereiro de 1908 o Rei D.Carlos I é morto no Terreiro do Paço, quando voltava de Vila Viçosa. Os seus assassinos são dois homens membros da Carbonária. Alfredo Luís da Costa nasceu em Casevél, em 1885, Castro Verde. Grande propagandista e panfletista republicano, presidia à Associação dos Empregados do Comércio de Lisboa, fundou com Aquilino Ribeiro a Social Editora.

Era caixeiro-viajante e, ao mesmo tempo, escrevia a favor da República em jornais populares lisboetas. Manuel dos Reis Buiça, nasceu em Vinhais em 1876, sendo 2º sargento no Regimento de Cavalaria de Bragança. Era republicano e carbonário. Estas duas personagens combinaram-se nessa tarde do dia 1 de Fevereiro de 1908 e mataram o Rei D. Carlos e o Príncipe Herdeiro D. Luís Filipe, ferindo o futuro rei D. Manuel II.

Segundo Machado Santos, tal regicídio foi feito sem o conhecimento de ninguém. Nesse dia deram-se ainda vários movimentos de tropas, todas leais à monarquia, sem contudo ter deixado de causar alguma confusão, tendo-se chegado mesmo a pensar, que estes estariam a iniciar um golpe republicano, o que na realidade assim não era.

Logo após a morte do Rei D.Carlos I, o novo monarca nomeia como chefe do governo o Almirante Ferreira do Amaral, tendo este introduzido o princípio da rotatividade, processo este designado por acalmação. Durante este período as autoridades monárquicas procuraram afastar de Lisboa os oficiais e praças de tendências liberais, forçando-os muitas vezes a fazerem missões nas ilhas e colónias.

Passou a ser imposto um severo controlo sobre a imprensa republicana, sendo a sua leitura proibida nos quartéis. Nessa altura a Carbonária era reorganizada, sendo seu Grão-Mestre Artur Duarte da Luz de Almeida.

Algumas notas prévias para a compreensão do 5 de Outubro e dos seus intervenientes
O 5 de Outubro de 1910 foi um golpe revolucionário, desencadeado por militares de patente intermédia e pelos populares e teve o apoio do Partido Republicano Português e da Carbonária Portuguesa. No exército existiam muitos oficiais que eram membros do Partido Republicano Português.

António Machado Santos, 2º Tenente da Administração Naval, era um dos principais dirigentes da Carbonária. O Partido Republicano Português contava com o apoio de um significativo número de oficiais superiores, enquanto a Carbonária Portuguesa tinha a sua principal base de apoio nos soldados e sargentos das forças armadas, bem como em muitos civis.

A Carbonária tinha a sua origem em Portugal na Maçonaria Académica. Este corpo maçónico estudantil não estava ligado à Maçonaria Portuguesa, mas era nas suas ideologias e organização que se afirmava. Teve a sua origem na fracassada revolta do 31 de Janeiro de 1891. Assenta as suas bases no Centro Académico Republicano e no Manifesto Republicano Académico. A Maçonaria Académica viria a transformar as suas lojas Independência, Justiça, Pátria e Futuro em Choças.

A Carbonária Portuguesa tinha a sua base ideológica na organização clandestina italiana de resistência à organização austríaca e viria a aceitar no seu seio membros provenientes do povo, na sua grande maioria do proletariado urbano, o que lhe valeu o afastamento de alguns académicos, que não concordavam com estes ingressos.

A Carbonária mantinha estreitas relações com o Grande Oriente Lusitano, tendo como principais dirigentes Luz Almeida, António Maria da Silva e Machado Santos. Estes três ilustres carbonários fundaram o Conselho Florestal da Carbonária, que viria a promover uma grande campanha a favor da revolta republicana.

O Partido Republicano Português tem a sua origem no Directório Republicano Democrático, fundado em 1876. Em 1890, com o ultimato inglês, os republicanos encabeçam as grandes manifestações que se realizaram em Lisboa contra a monarquia, manifestações estas que culminariam com a revolta do 31 de Janeiro de 1891, na cidade do Porto. As ideias republicanas baseavam-se principalmente nos ideais da revolução francesa.

O Partido Republicano Português era composto por Comissões Paroquiais, Provinciais e Distritais. Contudo, cabia aos Centros Republicanos e Centros Escolares Republicanos a maior fatia na mobilização das pessoas e divulgação dos ideais republicanos. O Partido Republicano Português era dirigido colegialmente através de um Directório.

Em 1900, o Dr. Afonso Costa, membro do Directório é eleito para o Parlamento. Esta eleição veio trazer um enorme mau estar aos deputados monárquicos, dadas as violentas intervenções daquele deputado contra a monarquia, tendo estes por sua vez cerrado fileiras contra o republicanismo, o que veio a ser também um dos factores que conduziu à infeliz ditadura de João Franco.

Esta atitude monárquica viria a ter consequências trágicas, com o assassinato do rei no Terreiro do Paço no dia 1 de Fevereiro de 1908. Do Congresso do Partido Republicano realizado em 1909 nascerá a Comissão de resistência da Maçonaria, que teria o incondicional apoio da Carbonária Portuguesa.

Foi então constituído um comité revolucionário, composto por João Chagas, Afonso Costa, António José de Almeida e Cândido dos Reis. Em Agosto de 1908 foi fundada a Liga das Mulheres Republicanas, que participou pela primeira vez no Congresso Republicano de 1909. Quando se dá a proclamação da República, em 1910, o Partido Republicano Português tinha mais de 160 agremiações como membros, o que era bem demonstrativo da sua importância e poder.

O 5 DE OUTUBRO DE 1910

Os preparativos
Os revolucionários republicanos realizavam várias reuniões secretas com o objectivo de prepararem o golpe militar, que iria implantar a República em Portugal. Machado Santos foi um dos oficiais da Marinha que teve uma importância fundamental no desenvolvimento do golpe militar.

Membro da Carbonária e seu director, era conhecido no seio desta instituição como o irmão Championet. No ano de 1907 Machado Santos foi contactado pelo seu colega Marinha de Campos e pelo Tenente do Exército da Índia, Mascaranhas Inglez, que o convidaram a tomar parte na revolução que o Partido Republicano estava a preparar para segundo aqueles salvar a Pátria.

Machado Santos um dos homens mais importantes da Carbonária e iniciado nesta em 1908, por Luz Almeida, é apresentado a António Maria da Silva, engenheiro de minas do exército, que pertencia à direcção da Carbonária. Contudo aquele admirava-se com a facilidade com que o Partido Republicano Português admitia nas suas fileiras os transfugas da monarquia.

Foi então realizada nesse ano de 1907 uma importante reunião no escritório do Dr. Alexandre Braga, onde estiveram presentes o Almirante Cândido dos Reis, o jornalista João Chagas, Alberto Costa, Serejo e Marinho e o próprio Machado Santos. Nestas reuniões era discutida a forte necessidade de se criarem núcleos coesos de marinheiros a bordo dos navios, de modo a que a revolução pudesse vir a ter um forte apoio das classes populares, que se encontravam representadas nos marinheiros e praças.

Era na realidade a Carbonária a fazer o seu trabalho, recrutando e mobilizando junto dos marinheiros, a sua base de apoio para a revolução. Quanto ao exército, existiam fortes dúvidas que este estivesse inteiramente com a revolução. Neste ano de 1907 já circulava em Lisboa uma clara ideia, que se estava a preparar um golpe republicano para derrubar a monarquia.

Machado Santos ficou encarregue de organizar os Núcleos de Marinheiros, os quais por sua vez estavam obrigados a obedecer a um oficial, de forma a que não fosse dada a impressão que a revolução não passaria de um simples motim de marinheiros e não de uma revolta devidamente organizada e comandada.

Tal como se esperava o exército, e apesar de também se ter reunido com Machado Santos, não se comprometeu na revolta. As reuniões com os marinheiros sucederam-se, tendo este conseguido trazer para o movimento revolucionário republicano um grande número de aderentes, recrutados nas tabernas de Alcântara, nos quartéis, nos navios, ao ponto de se terem conseguido reunir cerca de 800 homens.

Todo este envolvimento era feito com as necessárias precauções seguindo-se sempre o princípio de Cândido dos Reis quando disse a Machado Santos: Republicanos há muitos, revolucionários há poucos. Pode-se ser bom republicano e mau revolucionário; com poucos ou muitos devemos ir para a frente, para tentarmos salvar este desgraçado país. Mas, não se iluda: se formos vencidos, os que se dizem republicanos, para que o não suspeitem, comandarão, como os outros, os pelotões de fogo que nos hão-de fuzilar.

A 28 de Janeiro de 1908 dá-se a primeira tentativa séria de implantação da República. Coube ao Capitão-Tenente João José Serejo Júnior, que entretanto tinha sido reformado compulsivamente por uma junta moral, proceder ao recrutamento das praças, tendo-o Machado Santos nomeado comandante do Corpo de Marinheiros, que teria como uma das prioridades a libertação dos presos.

Estava também prevista a conquista do Arsenal da Marinha, ponto vital para a revolta. Os revolucionários projectavam igualmente prender o ditador João Franco, primeiro-ministro à altura, o qual seria levado para um barco de pesca e seria colocado às ordens dos revoltosos. Para este golpe, o Almirante Cândido dos Reis tinha programado que os seus oficiais se reunissem perto do Arsenal da Marinha.

Contudo, Machado Santos altera-lhe a táctica, uma vez que o Corpo de Marinheiros não tinha munições, as quais lhes tinham sido retiradas, tendo estes então dirigido-se ao navio São Gabriel, onde tudo se encontrava a postos para o início da revolta. Cândido dos Reis, Machado Santos, Tito de Morais, António Maria da Silva e mais alguns republicanos encontravam-se emboscados na zona da Rua do Arsenal à espera do sinal para avançarem, mas não tendo chegado qualquer comunicação decidiram abortar o golpe.

Nem João Franco foi aprisionado, nem Machado Santos consegue tomar o Palácio das Necessidades, local onde se encontrava o rei. Machado Santos, um dos directores do triunvirato da Carbonária e igualmente um dos principais revoltosos republicanos, é destacado para a canhoneira Zambeze , tendo sido enviado para a colónia da Guiné , em 1908, donde regressa em Junho desse mesmo ano.

Chegado a Portugal imediatamente se reúne com o Dr. António José de Almeida, do Directório do Partido Republicano Português, e Luz de Almeida, colocando-se de imediato à disposição daqueles para continuar a sua actividade revolucionária em prol da República e da sua implantação.

Machado Santos e o seu grupo de Carbonários elegeram o Dr. António José de Almeida como o elemento de ligação com o Directório do Partido Republicano Português e com quem se reuniram várias vezes. Entretanto, Machado Santos e os republicanos continuavam a preparar grupos de civis, os quais viriam a ter como finalidade a tomada das guarnições militares.

Entre 1908 e 1909, a Carbonária duplica os seus membros, que se encontravam espalhados não só na população civil, bem como entre os militares. Inicialmente a Carbonária estava confinada só à cidade de Lisboa, mas pouco a pouco foi-se expandindo para outros centros.

Após o falhanço do golpe republicano de 28 de Janeiro de 1908, deu-se continuidade à organização dos praças e sargentos das guarnições de modo a que quando chegasse o dia certo estes estivessem preparados a intervir no golpe e pudessem ter oficiais republicanos a quem respondessem.

A Guarda Fiscal foi o primeiro corpo de tropa que aderiu a este movimento, tendo-se seguido Artilharia 1, Cavalaria 2 e Cavalaria 4. No dia 2 de Agosto de 1909 dá-se uma grande manifestação da Carbonária, na qual desfilaram de modo disciplinado mais de 100.000 pessoas.

Entretanto a Carbonária, perante uma certa inoperância do Directório do Partido Republicano Português, inicia a distribuição de diversa propaganda republicana, em que se destacam os Barbadões, que eram compostos por estrofes em que uma destas era para ser cantada com a música da Marselhesa e ainda a Cartilha do Cidadão de Luz Almeida, publicada pela loja maçónica Montanha.

Luz de Almeida era proveniente da Maçonaria Académica, mais conhecida por Junta Revolucionária Académica. Formado em Letras, funda a Carbonária Portuguesa, sendo esta basicamente proveniente da Maçonaria Académica.

Foi um dos principais ideólogos do 5 de Outubro de 1910. Neste espaço de tempo, a Marinha começava a mobilizar-se em força, sendo a tripulação do cruzador D. Carlos forte apoiante do movimento republicano. Entretanto Machado Santos e os seus correligionários continuavam
a fazer uma forte campanha para atraírem à causa republicana muitos oficiais, já que consideravam aqueles fundamentais para o sucesso do golpe revolucionário.

António Maria da Silva tentava encontrar um oficial que aceitasse o comando das forças terrestres. Magalhães Lima também se encontrava envolvido na preparação do golpe republicano, trazendo para esta causa alguns oficiais, entre eles o Capitão de Fragata Fontes Pereira de Melo.

Entretanto Cândido dos Reis encarrega Fontes Pereira de Melo, o Coronel de Artilharia Ramos da Costa e o Capitão José Afonso Palla de programarem o plano definitivo para o golpe revolucionário para o derrube da monarquia. Por todo o país era espalhada a propaganda republicana e em todo o país as adesões eram muitas.

Procurava-se ter grupos civis que na altura certa estariam encarregues de invadir as unidades do exército e fazer com que assim esta força aderisse ao golpe, contando para isso com a conivência dos oficiais e praças republicanos que integravam essas unidades. Tentou-se então comprar na Suíça 5000 armas pelo valor de 14 contos de reis, mas tanto o Directório do PRP como a Carbonária não dispunham de tal verba para fazerem a aquisição desse armamento.

Existiam algumas divergências entre o Directório do PRP e a Carbonária, liderada por Machado Santos. Enquanto o Dr. Bernardino Machado, do PRP, considerava o golpe e extemporâneo e a ser levado a efeito pela rapaziada, os carbonários chamavam aos ilustres do Directório do PRP cabeças grisalhas, numa clara alusão à idade de alguns membros do Partido Republicano.

Após este episódio, a Alta Venda da Carbonária, reunida no Jardim do Forte de Almada, decidiu assumir sozinha a liderança do golpe, dado que consideravam que os dirigentes do PRP não estariam interessados em seguir a sua delineação. Decidiram ainda abrir um peditório para angariação de dinheiro para a compra de armas.

A subscrição destinava-se à educação cívica do povo, mero expediente para encapotar o verdadeiro destino do dinheiro, que era apenas a compra de armas, tendo-se conseguido angariar a quantia de 400 mil reis, tendo contribuído muita gente, incluindo monárquicos e adeptos do franquismo.

Luz de Almeida entretanto é obrigado a exilar-se em Paris, onde se encontrava quando se deu a implantação da República, dado que foi descoberta a sua ligação à Carbonária Portuguesa como seu Grão-Mestre.

Os carbonários consideravam ainda que o Directório do PRP não estava devidamente mobilizado para o golpe e consideravam ainda que este era culpado pela perca de muitos aderentes ao golpe republicano, que se estava a preparar, em virtude das constantes dúvidas e hesitações que mostravam em face das informações que os carbonários lhes davam, no que diz respeito à organização do movimento revolucionário republicano.

Muitos militares, suspeitos de serem simpatizantes da República, foram entretanto passados à reserva e muitos outros transferidos, o que enfraquecia o movimento republicano e anulava o esforço feito no aliciamento de militares para o golpe. No dia 1 de Abril de 1910 esteve para ser preso o rei.

Os revoltosos sabiam que a Guarda do Palácio das Necessidades era a favor da causa republicana, contudo era necessário que Caçadores 2 e a Infantaria 2 aderissem ao golpe. Os oficiais destes dois últimos regimentos não aderiram a esta iniciativa pelo que esta se gorou.

Entretanto continuavam a existir divergências entre o Directório do Partido Republicano Português e os carbonários. Enquanto os primeiros consideravam que seriam precisos 300 a 500 contos de réis para se efectuar o golpe republicano, Machado Santos, dirigente do triunvirato carbonário, considerava que 7 ou 8 contos de réis seriam suficientes.

Todas estas divergências iam atrasando o golpe republicano. Estas disputas estendiam-se igualmente entre a Carbonária e algumas lojas maçónicas, mormente a Acácia. A 14 de Julho de 1910 esteve novamente preparado outro golpe militar com a colaboração de Artilharia 1 e Caçadores, tendo sido contudo abortada mais esta tentativa.

Em 19 de Agosto novo golpe esteve agendado, mas foi de novo cancelado. Isto era, sem dúvida, uma consequência das divergências entre
a Carbonária e o PRP. João Chagas era um dos revoltosos que considerava que a Carbonária não fazia falta para integrar o golpe revolucionário. Assim não pensava o Capitão de Fragata Fontes Pereira de Melo.

Na realidade a Carbonária tinha recrutado quase todos os elementos do exército e da marinha e os civis envolvidos na revolta eram quase todos carbonários. As lojas maçónicas tiveram igualmente um importante papel na preparação do golpe e em especial a Montanha. O plano popular passava pela criação de seis comandos em Lisboa, os quais tinham como principal objectivo o de impedirem os movimentos da Guarda Municipal, fiel à Monarquia.

Para além destes, foram formados diversos grupos civis que teriam como função a sublevação das várias unidades militares da capital e arredores, para além de tomarem e silenciarem as comunicações telefónicas e telegráficas. O início da revolução dar-se-ia a uma hora combinada e não a qualquer sinal, o que obteve o acordo de Cândido dos Reis.

O Directório do Partido Republicano Português, representado por José Relvas, Eusébio Leão, José Barbosa, Malva do Vale e Inocêncio Camacho deram o seu acordo a este plano. Coube a Cândido dos Reis marcar o dia da revolta e igualmente a distribuição das armas pelos civis.

O golpe revolucionário
No dia 1 de Outubro a Comissão de Resistência é informada pelos marinheiros e praças dos regimentos que os navios se aprontavam para partir no dia 4 de Outubro e solicitam que se dê início imediato à revolta. Contudo não são dadas ordens imediatas para a realização da revolta, sem que se entenda bem as razões que levaram Cândido dos Reis a não o fazer.

No dia 2 de Outubro, Cândido dos Reis, Machado Santos e oficiais da marinha acordam no escritório do advogado Eusébio Leão, iniciar a revolução à 1 hora do dia 4 de Outubro de 1910.

Nesse mesmo dia 2 de Outubro à noite a Comissão de Resistência reuniu-se no Centro de S. Carlos, e ficou definitivamente resolvido que a revolta se iniciasse no dia 4 de Outubro à uma da madrugada. A esta reunião assistiu o Dr. António José de Almeida. Machado Santos sai desta e procura encontrar marinheiros da sua confiança, tendo encontrado Carlos Cadete do navio Adamastor a quem entregou as bandeiras republicanas, que deveriam ser hasteadas nos navios, tendo este avisado igualmente o navio S. Rafael.

No dia 3 de Outubro é contactada a Artilharia 1 e Infantaria 16. Neste mesmo, os elementos civis são avisados do dia e hora marcados para a revolução. Não existiam mais sinais, os quais tinham levado ao fracasso do 28 de Janeiro de 1908. Existia uma hora e uma data, em que todas as forças se deveriam sublevar.

Nesse mesmo dia dá-se o atentado contra Miguel Bombarda perpetado por um doente mental e que o viria a matar. Cabia a Miguel Bombarda coordenar os grupos de civis e ainda comandar aquele que procederia ao levantamento de Artilharia 1. Já no leito da morte, teve ainda tempo de passar o seu testemunho e a sua missão a Brito Camacho.

Nesse mesmo dia o Almirante Cândido dos Reis, presente no Centro S. Carlos, transmite a todas as forças a senha da revolução que era a seguinte: Mandou-me procurar? Passe cidadão!

Nessa reunião o Almirante despede-se de Machado Santos, dizendo-lhe que era possível que não se voltassem a encontrar e assim foi. Machado Santos encarregue de sublevar e comandar Infantaria 16, dá ordens para que um grupo de sessenta homens armados se dirigisse à porta de armas à meia-noite e quarenta e cinco minutos do dia 4 de Outubro de 1910, para que esta fosse aberta e então se procedesse ao levantamento das casernas.

A distribuição das armas tinha sido feita de forma muito deficiente e Machado Santos temeu então seriamente que o golpe fosse um tremendo fracasso. Machado Santos decidiu naquela altura envergar a sua farda de gala preparando-se para a morte, se tal acontecesse. Chegada a hora, Machado Santos dirige-se a Infantaria 16, mas encontra a porta fechada.

Entrando à força, logo obtém o apoio de todos os soldados e segue para Artilharia 1, depois de deixar uma guarda de retaguarda de 30 homens. Chegado a Artilharia 1, também as portas se encontram fechadas, tendo sido igualmente arrombadas, o que permitiu a entrada de mais de 200 homens provenientes de Infantaria 16. Também aqui os soldados aderiram ao golpe, tendo sido apreendidas para a revolução todas as armas e munições ligeiras.

Igualmente são aqui apreendidas todas as baterias. Iniciou-se então a marcha para as Necessidades, local onde se encontrava o rei, tendo-se dado de imediato na rua Ferreira Borges o primeiro recontro com a Guarda Municipal. Outras baterias dirigiram-se para o Largo do Rato. Entretanto os civis iam sendo armados com armas provenientes dos assaltos, que tinham sido feitos às esquadras de polícia.

Chegados à Avenida (hoje da Liberdade) dão-se vários recontros com forças monárquicas e então Machado Santos decide formar as tropas na Praça Marquês de Pombal. Eram então cinco horas da manhã do dia 4 de Outubro de 1910. Nesta posição Machado Santos e as forças republicanas conseguiram confiscar vários telegramas e assim veio a saber que os republicanos já tinham conquistado muitas povoações na margem esquerda do Tejo.

Às sete da manhã desse dia 4 de Outubro, Machado Santos é informado da morte do Almirante Cândido dos Reis, o qual se tinha suicidado convencido do falhanço do golpe. Reunido de imediato o Conselho de Oficiais foi proposto a Machado Santos retirar, sendo desta forma abortado o golpe revolucionário.

Este rejeitou com o argumento que enquanto dominassem a Rotunda e a artilharia dos navios presentes no Tejo teriam enormes possibilidades de vencer, tendo então prosseguido a sua luta. A determinada altura Machado Santos apercebe-se da fuga de muitos oficiais e civis, ao ponto da sua força se encontrar reduzida a metade.

Machado Santos e as forças republicanas encontravam-se cercados na Rotunda pela guarnição de Lisboa, tendo chegado mesmo a pensar em se suicidar, tal era a posição desesperada em que se encontravam. Contudo, por respeito aos elementos que o acompanhavam decidiu prosseguir a luta.

Estavam com ele apenas 9 sargentos, já que todos os oficiais tinham abandonado a Rotunda. Restavam então 8 peças de artilharia e 200 homens. Nessa manhã Machado Santos apercebe-se ainda que os marinheiros não tinham desembarcado e que estava prestes a ser atacado pelas baterias de Queluz, Infantaria 2 e Lanceiros.

Foram entretanto construídas trincheiras para a defesa dos homens presentes na Rotunda. O Dr. Malva do Vale, membro do Directório do Partido Republicano Português encontrava-se presente na Rotunda. Às tropas iam-se juntando muitos civis armados e muitos outros que solicitavam que lhes fossem distribuídas armas.

Entretanto os populares iam construindo barricadas com tudo o que encontravam. Nessa altura muitos maçons e carbonários dirigiram-se à
Rotunda já que era aí que se encontrava centralizado o combate, local que era palco de um tiroteio infernal. Ao meio-dia e meia desse dia 4 de Outubro, começaram a cair na Rotunda as primeiras granadas das baterias de Queluz, atingindo em cheio as primeiras linhas de fogo republicanas.

Da Rotunda e de Artilharia 1 era dada a resposta ao fogo monárquico. Pelas 4 horas da tarde terminou esta batalha da Rotunda com a retirada das baterias de Queluz. Entretanto, conhecida a vitória da Rotunda, vários praças das forças monárquicas vieram apresentar-se às tropas republicas estacionadas na Rotunda. Estes praças eram oriundos de Infantaria 16, Caçadores 5 e Infantaria 5.

Nesta altura a moral das forças monárquicas encontrava-se extremamente baixa. Da Rotunda as forças republicanas iam enviando tiros de bateria contra essas tropas para as obrigar a retirar, o que ainda baixava mais o moral destas. Entretanto continuavam a chegar à Rotunda muitos oficiais e populares. A dinâmica de vitória estava em marcha.

Contudo, da Rotunda as forças republicanas continuavam a flagelar com a artilharia as forças monárquicas, tendo como base as informações da posição daquelas forças que aqui chegavam trazidas por populares e militares. Às 8 horas da noite desse dia 4 de Outubro de 1910, encontravam-se na Rotunda a combater cerca de 500 militares e 500 civis armados, o que para a altura era já uma força notável.

Nesse dia 4 de Outubro pelas 11 horas da noite as forças monárquicas, num último esforço, tentaram inverter a situação, tendo-se desencadeado então uma forte refrega, que durou largas horas. Às 6 da manhã do dia 5 de Outubro a situação das forças republicanas na Rotunda era ainda bastante frágil. Encontravam-se cercados e continuavam a ser flagelados pela artilharia estacionada no Torel e nos Restauradores.

Até àquela hora não se tinha dado o desembarque dos marinheiros, o que muito prejudicava a situação das forças republicanas. Dá-se então às 8 horas e 15 minutos desse dia 5 de Outubro de 1910 um episódio deveras importante no contexto desta revolução O encarregado de negócios da Alemanha subiu a Avenida com uma bandeira branca e entregou a Machado Santos uma missiva do General Gorjão, oficial das forças monárquicas, na qual este propunha uma pausa de uma hora nos combates, de forma a que as famílias estrangeiras pudessem
abandonar Lisboa.

Machado Santos logo compreendeu que numa hora era impossível as famílias deixarem Lisboa e que tal missiva tinha como única finalidade a reorganização das forças monárquicas por forma a que pudessem ser concentradas contra a resistência que se manifestava na Rotunda. Machado Santos ao declinar tal proposta recebeu do diplomata alemão a ameaça de que a Alemanha poderia envolver-se nesta disputa.

Perante isto e por prudência, Machado Santos decide aceitar e assina um acordo em que se compromete a interromper as acções militares entre as 8 horas e 45 minutos e as 9 horas e 45 minutos, dessa manhã de 5 de Outubro. Contudo, é informado pelos soldados monárquicos, que acompanhavam o diplomata, que a moral das forças monárquicas era muito baixa.

Então Machado Santos, eram 6 horas e 35 minutos desse dia 5 de Outubro, num golpe genial e antes de se iniciar o prazo de suspensão dos combates, decide dirigir-se ao Quartel-General em S. Domingos, acompanhado de muito povo e tropas e aí proclama a República ao General Rafael Gorjão e a todo o seu estado-maior.

O general e o seu estado-maior rendem-se a Machado Santos e este compromete-se pela segurança do rei, até à sua partida para o exílio. Nessa mesma altura surgem no Quartel General, Inocêncio Camacho e José Barbosa, que anunciam a Machado Santos a proclamação da República e a constituição de Governo Provisório.

Na Rotunda calcula-se, que tenham existido entre mortos e feridos cerca de 200 baixas. De assinalar que o Conde de Sabugosa cedeu a cocheira às forças republicanas para aí instalarem um hospital. Acabada a batalha da Rotunda Machado Santos emitiu a seguinte Ordem Do Dia nº 1

O Comandante das forças acampadas na Rotunda determina e manda publicar o seguinte:
Cidadãos! Um facto notável se acaba de dar, que ficará gravado a letras de ouro na história da nossa querida Pátria. A República, devido aos esforços dos bravos que acamparam na Rotunda, dos valentes marinheiros e da nobre e valorosa população civil da cidade de Lisboa foi hoje proclamada! A dinastia de Bragança, que há 270 anos, pesando sobre o país, o levou à ruína, à miséria e ao desprezo das nações estrangeiras, vai a caminho do exílio e nunca mais os seus representantes ousarão macular o solo sagrado da Pátria! Cidadãos!

O vosso gesto altivo levou ao conhecimento do Mundo inteiro, que neste canto da Europa existe um Povo que deseja, em liberdade, trilhar o caminho do Progresso. Nunca mais os estranhos deixarão de olhar com respeito os filhos de Portugal!

A luta terminou! Já não há inimigos! Hoje todos os portugueses, trocando abraços fraternais, vão colaborar na obra da regeneração da pátria! Já não há inimigos! Há só irmãos! Em nome do governo da República, louvo todos aqueles que tive a honra de comandar e que, numa luta homérica de um contra dez, tão bem souberam defender os seus ideais: Pátria e Liberdade.
Viva a República!

Quartel General da Rotunda, 5 de Outubro de 1910
(1.ª República).
Machado Santos
Comandante


Alguns outros intervenientes no golpe republicano
Existiam muitos grupos republicanos deficientemente armados, que tinham como objectivo o de dificultarem as movimentações da Guarda Municipal, corpo afecto à monarquia. No dia 4 de Outubro pela 1 da madrugada dá-se o assalto ao Quartel dos Marinheiros. Este assalto é feito por alguns marinheiros e civis, armados apenas com algumas pistolas e bombas.

Posteriormente os marinheiros tentam assaltar o Palácio Real, contudo são travados nas suas intenções na então Rua 24 de Julho pelo regimento de Infantaria 1. Entretanto tinham sido dadas ordens para que os navios São Rafael e Adamastor bombardeassem o Palácio Real.

Assim que Infantaria 16 deu os tiros de aviso do início da revolta, um grupo de marinheiros revoltou-se no São Rafael e perante a resistência do seu comandante Policarpo de Azevedo, alvejam-no, ferindo-o.

À 1 hora e 10 minutos desse dia 4 de Outubro o São Rafael dá 3 tiros avisando os outros navios do início da revolta. Entretanto o navio Adamastor avisa o São Rafael que já se encontra em poder dos republicanos. Às 9 horas da manhã do dia 4 de Outubro, Tito de Morais com mais 50 homens do Adamastor toma o navio Isaura, aprisionando-o em nome da República.

Todo o Quartel dos Marinheiros embarcou nesse dia 4 de Outubro, pelas 15 horas, nos navios São Rafael e Adamastor. O São Rafael, pelas 16 horas do dia 4 de Outubro, iniciou o bombardeamento das forças monárquicas, atingindo-as no Rossio e no Terreiro do Paço. No dia 5 de Outubro, logo pelas 7 horas da manhã, forças provenientes do navio São Rafael, conquistam o arsenal do Alfeite.

Entretanto o navio Adamastor é tomado pela sua guarnição no dia 4 de Outubro, quando esta se apercebe do tiroteio entre as forças monárquicas e republicanas. A guarnição do navio D. Carlos foi a que mais tarde aderiu à revolta, já que no seu seio não tinha ninguém que a comandasse.

Pelas 8 horas da noite do dia 4, 17 homens vão ao navio Adamastor para levarem armamento. Daqui partem acompanhados por José Carlos da Maia. Chegados ao D. Carlos recebem a total adesão da guarnição, tendo-se desencadeado um forte tiroteio entre os assaltantes e os oficiais, sendo estes últimos presos.

No dia 5 de Outubro o vapor Azinheira, pertencente ao Arsenal do Alfeite da Marinha, dirigiu-se à fragata D. Fernando, tendo-a aprisionado sem qualquer resistência. Daqui seguiu esta fragata para o navio Pêro de Alenquer, o qual foi igualmente aprisionado sem qualquer oposição.

Os navios Bério e D. Luís aderiram espontaneamente à revolta, logo que verificaram que muitos outros navios já o tinham feito. Entretanto, na margem sul do rio Tejo, a Escola de Torpedos acabou por ser tomada sem qualquer resistência, tendo sido arrombadas as portas do seu arsenal onde se encontravam muitas munições, que seriam transportadas para Lisboa.

Tropas provenientes do navio Adamastor e outras oriundas da Escola de Torpedos, tomam conta desse importante aquartelamento na manhã do dia 5 de Outubro. Tomada a escola, os revoltosos apoderam-se dos navios torpedeiros, fundeando-os em frente de Lisboa, os quais viriam mais tarde a bombardear o Palácio das Necessidades, local onde se encontrava refugiado o rei D. Manuel II.

Todas as comunicações da margem sul do Tejo estavam nas mãos dos republicanos. De tal forma se encontrava avançada a revolta naquela região, que a República chegou mesmo a ser proclamada no próprio dia 4 de Outubro. Na Escola do Exército houve muitas hesitações, devido a uma clara falta de comando. Alguns alunos desta escola viriam a participar no golpe, tendo-se para o efeito deslocado para a Rotunda e tendo aí combatido ao lado dos republicanos.

Infantaria 5 e Caçadores 5 só aderem ao golpe republicano no dia 5 de Outubro. Infantaria 2 estava infiltrado por elementos republicanos.
Contudo este regimente dirigiu-se inicialmente à Rotunda para atacar as forças republicanas. Os elementos republicanos que o integravam conseguiram minar a moral dos seus companheiros, pelo que este corpo de tropa retirou-se para o quartel de Infantaria 1, desistindo de combater os republicanos.

Caçadores 2 aderiu ao golpe com facilidade, já que os seus oficiais eram na sua grande maioria simpatizantes da República. A Guarda Fiscal também aderiu ao golpe. O Arsenal do Exército é atacado por tropas que se tinham armado no navio S. Rafael e conquistado na manhã do dia 5 de Outubro. O Cabo Submarino foi ocupado em Carcavelos, pelas forças republicanas.

Em Alcântara as forças revoltosas conseguiram eliminar Cavalaria 4, que derrotados retiraram. As forças republicanas dispunham no início de um total de 17 automóveis, os quais tinham um fim fundamental para a revolução. Cabia-lhes a tarefa de transportar mantimentos para as tropas. Contudo e inexplicavelmente, estes automóveis viriam a desaparecer, pelo que foi impossível a sua utilização.

Os republicanos tinham ainda inúmeros comités espalhados pela província, prontos a entrarem em acção logo que o golpe fosse desencadeado. Vendas Novas, Évora, Beja, Faro, Setúbal, Santarém, Coimbra, Aveiro, Vila Real, Viseu, Braga e Viana do Castelo eram os pontos mais fortes dos republicanos. A Beira Baixa constituía um dos pontos mais fracos.

Na província encontravam-se muitos republicanos que tomaram parte activa na implantação da República, fazendo em cada uma das suas terras um trabalho notável. Da província veio ainda grande parte do dinheiro com que o Directório do Partido Republicano Português comprou as armas para a revolta de Lisboa.

Em Loures no Centro Escolar Republicano, os republicanos aí reunidos, no dia 4 de Outubro de 1910, decidem ocupar os Paços do Concelho daquela então vila, hasteando uma bandeira verde e vermelha, as cores da República e proclamando a implantação da República em Loures.

Conclusão
A República foi proclamada nesse dia 5 de Outubro, às 10 horas da manhã. Coube a Eusébio Leão, membro do Directório do Partido Republicano, fazer essa proclamação na varanda dos Paços do Concelho e Lisboa. Encontravam-se neste local as gradas figuras do Partido Republicano Português, mas nenhuma das que tinha estado no combate da Rotunda.

Foi constituído um governo provisório presidido por Teófilo de Braga. Nenhum membro da Carbonária fazia parte deste governo. Que leitura se deve fazer deste facto? Divergências entre carbonários e republicanos do PRP?. Talvez nunca se saiba. Normalmente, os bons operacionais, aqueles que fazem as revoltas, tendem a ser esquecidos após as revoluções que venceram.

A comprovar isto, Machado Santos é assassinado pelo “Dente de Ouro”, nome dado ao cabo Abel Olímpio, na vergonhosa Noite Sangrenta de 19 Outubro de 1921, fuzilando-o na Avenida Almirante Reis, quando se dirigiam ao Arsenal. Na realidade o 5 de Outubro de 1910 era um desejo do povo português. Poucos dias antes da revolução republicana, tinha sido realizado em Lisboa um grande comício convocado pelo
Partido Republicano Português, no qual participaram milhares de pessoas de todas as classes sociais.

Para além disto, a população civil empenhou-se de forma nobre e entusiasta no golpe, participando nele ao lado das forças militares. Sem Machado Santos, a República não teria certamente sido implantada em 5 de Outubro de 1910. A sua abnegação, vontade, determinação, inteligência, espírito de sacrifício e grande capacidade de comando fizeram dele a mais alta personalidade da República, virgem e democrática do 5 de Outubro de 1910.

Não nos esqueçamos que estávamos numa época em que as comunicações de hoje entre regimentos não existiam. Tudo era feito por emissários e por forma oral e visual. Sem a participação do Partido Republicano Português, a nova república não teria as bases sociais e intelectuais, onde se encontravam aqueles que viriam a ser os seus dirigentes máximos.

Sem a Carbonária, representante do povo, a revolta talvez nunca tivesse tido sucesso, já que foi desta que saiu a principal organização de comités civis e militares, que seriam fundamentais não só na angariação de novos republicanos, como igualmente na preparação e realização do golpe.

Bibliografia
PEREIRA, Marçal Vaz, "A Revolução Republicana do 5 de Outubro de 1910" in Portugal 2010 - Exposição Mundial de Filatelia - www.fpf-portugal.com
TRIGUEIROS, António Miguel, "Moedas Comemorativas de Portugal" in Revista Petrovisão nº 28 - Janeiro de 1985

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